consciência corruptaSonia Regina Lunardon Vaz, uma psicóloga junguiana, escreveu um artigo muito interessante cujo tema é “Os zumbis – consciência corrupta e corruptível”. Nesse texto muito bem elaborado, Regina traz o conceito tradicional de zumbis pelo Vodu afro-caribenho, cita o filósofo australiano David John Chalmers com sua definição de “zumbi filosófico” e o psiquiatra britânico Ronald David Laing, que em seu livro “O Eu Dividido” (The Divided Self), equipara a doença da esquizofrenia, em seus primeiros estágios, com o processo de “zumbificação”. Ela relata que as histórias de zumbis têm origem no sistema de crenças espirituais do Vodu afro-caribenhos com trabalhadores controlados por um poderoso feiticeiro. O ser humano morto volta à vida com o intuito maligno de servidão ao seu invocador.

A autora vai além e traz Nietszche para a discussão:

“Segundo Nietzsche, “o que é de temer, o que tem efeito mais fatal do que qualquer fatalidade, não é o grande temor, mas o grande “nojo” ao homem, e também a grande compaixão pelo homem.” O nojo, ou o desprezo do homem para com o homem, gera a misantropia que, por sua vez, gera fracos que não querem mais enfrentar os conflitos, aqueles que querem o “nirvana”, não querem mais sofrer. Na verdade, não querem mais viver. Porque a vida é conflito.

(…) O grande perigo ao ser humano são os doentios, não são os maus, são aqueles já vencidos e destroçados com sua consciência corrupta e corruptível; que corroem a vida e sua intensidade; que perigosamente envenenam e levam a questionar a confiança na vida e no ser humano. São estes que espalham, por toda parte, algo semelhante ao ar de hospício ou de hospital, como observou Nietzsche ainda em a Genealogia da Moral.

É aí, neste solo do desprezo que cresce o desejo de levar vantagem em tudo, o rancor e a rede malévola de conspiração contra a vida e contra todo e qualquer ato de vida e contra todo e qualquer ato de sucesso e de alta intensidade. É onde a verdade é assolada e a mentira sofisticada e melosa ganha tributos.

É aí que a simples visão daquele que vai para o enfrentamento do conflito ou daquele que é vitorioso, é simplesmente odiada”.

Regina cita também Foucault:

“Foucault em sua tese sobre biopolítica lembra que: O homem, durante milênios permaneceu o que era para Aristóteles: um animal vivo e ademais capaz de uma existência política; o homem moderno é um animal em cuja política de estar vivo é o que está em questão.

Nessa fala parece haver uma denúncia de que o homem moderno passou de sujeito da ação para o objeto da ação. Essa situação abre para a corrupção porque o homem moderno se encontra a mercê de uma parcela mínima da sociedade que exerce poder sobre ele. Tudo o que faz e pensa, ao invés de propiciar-lhe uma ação política, acaba gerando uma ação que será destituída de seu poder pela distorção intelectual e moral que vá de encontro à parcela dominante da sociedade, por que esta parcela dominante não acolhe sua ação política, simplesmente analisa, critica e o detém como um objeto que ousou expressar-se e tem como aliado aqueles que são influenciados, domesticados, condicionados, inconscientes e inconsequentes.

Muitas vezes, pelas limitações de nosso conhecimento, temos dificuldade em enxergar o que está nas entrelinhas da argumentação de pensadores atuais e do passado que, pela genialidade e forma diferente de ver a realidade em seu tempo, deixam legados que ainda estão por ser descobertos no esforço de compreender os problemas de nosso tempo.

Os zumbis modernos não são “mortos-vivos”, pessoas ressuscitadas pela magia negra, mas seres que transitam num universo mental paralelo. Eles são seres “subviventes” numa era em que nos tornamos escravos de uma racionalidade contaminada pela ilusão do não morrer, da vida eterna e do nunca envelhecer.

Parece que na política brasileira fomos invadidos por zumbis modernos.

 

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