Zumbis

Os zumbis modernos não são “mortos-vivos”, pessoas ressuscitadas pela magia negra, mas seres que transitam num universo mental paralelo. Eles são seres “subviventes” numa era em que nos tornamos escravos de uma racionalidade contaminada pela ilusão do não morrer, da vida eterna e do nunca envelhecer.

Com a perspectiva de uma possível independência individual, de poder excluir da Vida tudo aquilo que não convém, de ter a perspectiva da imortalidade com a eliminação das doenças e do sofrimento, a redução do envelhecimento, com a ideia do controle sobre tudo, da possibilidade da ausência de riscos, nossos jovens acomodam-se numa não-vida.

Tudo que temos ensinado às crianças e aos jovens nos últimos tempos como modelo de se viver bem, não é a Vida. A Vida é exatamente o avesso de tudo que elencamos acima. A Vida é risco, é mudança permanente, é dependência dos outros. A Vida é feita de imprevistos, de descontroles, de sofrimentos e de impossibilidade de exclusão do que quer que seja. Só na morte temos estabilidade, segurança, controle, independência, certezas e ausência de sofrimento.

Mas, então, não seria um paradoxo que os zumbis modernos busquem tanto os riscos das drogas, do tráfico, das seitas fundamentalistas, dos esportes radicais, da solidão das ruas, onde nenhuma das promessas da modernidade e do avanço tecnológico parece estar presente? Não era de se esperar que a consciência dos malefícios das drogas fosse suficiente para impedir a utilização exagerada delas por essa população? Por que os riscos para a saúde física, mental e social não sensibilizam essas pessoas?

As pessoas não se tornam zumbis pelo uso de drogas; passam a usar drogas por serem zumbis. As drogas, sejam as ilícitas ou o abuso das lícitas, dão aos subviventes um vislumbre das sensações agradáveis que só a Vida permite. Assim, a droga passa a ser utilizada como um modo de experimentar momentos de felicidade, simulando a Vida. Mas, quando as sensações passam, uma forte depressão se abate e, como um zumbi não sabe usufruir da Vida essas mesmas sensações, o subvivente volta a usar as drogas, mais e mais. Por outro lado, os riscos assumidos para se ter acesso e usar as drogas também acabam funcionando como algo excitante, mais próximo do imponderável que é a Vida.

Zumbis da modernidade buscam as drogas como um meio de atender a seus instintos naturais de viver a Vida como ela realmente é. Num ciclo destrutivo, as drogas oferecem a ilusão de um viver real, que torna os subviventes dependentes delas e, portanto, aprofundam o processo de zumbificação. Somente ressignificando a Vida e o viver conseguirão perceber que o risco/benefício de viver a Vida é imensamente menor que o risco/benefício de sermos zumbis no mundo das drogas. Por isso, a reeducação emocional é tão ou mais importante do que simplesmente afastar as drogas. O dependente precisa sentir que é possível ter momentos de felicidade quando compreendemos as maravilhas que o viver verdadeiro nos oferece.

Talvez, os poucos momentos e sensações proporcionados pelas drogas pareçam compensar o que para essas pessoas parece impossível de ser conseguido apenas vivendo plenamente a Vida.

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