No livro A Poética do Brincar (Marina Marcondes Machado – Edições Loyola), a autora revela uma faceta interessante do fazer acontecer relacionada à poética, ética e estética do brincar. Resgatando o termo “poiésis”, aprofunda o processo de realização que nada mais é do que um ato de criação. Para Aristóteles, poiésis designava a poesia e também a arte.
Marina alega que brincar é produzir, fabricar, criar, ou seja, o brincar é a poiésis de cada criança. Por isso, o adulto que se permite voltar à infância e assume o “brincar” com liberdade, “estará no exercício de uma ética e de uma estética do brincar”.
Assim, vemos que criar a realidade que desejamos tem uma ética, uma estética, um design e uma magia que remontam ao despertar do fazer acontecer da infância, cuja forma visível é o brincar. Sem essas três dimensões mais sutis que ajudam a formar as competências de um realizador apto à criação do real, teremos alguém com dificuldades para inovar
Eu iniciei meus estudos aos sete anos, após uma infância feliz com brincadeiras e amigos da rua. Futebol, bolinha de gude, rodar pião, empinar pipa, pega-pega, canções de roda, esconde-esconde, eram brincadeiras do dia a dia que desenvolviam nossas competências emocionais, relacionais e cognitivas todos os dias. Nós escolhíamos as próprias brincadeiras e construíamos os próprios brinquedos. Meus vizinhos eram meus amigos próximos. Eu conhecia suas casas, suas famílias, seus problemas. Crescíamos juntas, crianças de todas as idades, raças, religiões, unidas pelo prazer de viver intensamente cada dia brincando. Brigávamos hoje, brincávamos amanhã, sem ódio, sem remorso, sem mágoas. Víamos nos nossos vizinhos companheiros de brincadeiras. Sem eles, com quem brincar?
Hoje a cultura do virtual, do brinquedo pronto, o isolamento, a falta de espaços para brincar, todos esses fatores juntos talvez estejam reduzindo a possibilidade de formarmos adultos ativos e criativos.
E mesmo nós, adultos, precisamos nos permitir mais e voltar a brincar. Deixar de levar a vida tão a sério e resgatarmos a criança que ainda está dentro de nós, exatamente como lembramos dela.
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